Twister City: The Mystic's Dream

As luzes da cidade brilham de forma cegante e extravagante. Tudo lutando para ganhar a atenção dos viajantes. No tumulto de uma cidade gigante, na confusão de sons e cores, a única que detém meus olhos é Alice. Séria, com sua capa preta e seu cabelo roxo se movimentando ao vento. Silenciosa. Majestosa.

Sei que meu amor por Alice parece ultrapassar os limites, porém nesse mundo perdido eu sinto como se fosse o único a compreendê-la e a lutar por ela. Não posso permitir que ela não se sinta amada, não me importa o que os outros acham.

Caminhamos por Twister, a cidade mais barulhenta que já vi. Hoothoot, o pokémon que conquistei para Alice no torneio, pia e voa de um lado para o outro. Um filhote ainda. Pousa no ombro da minha criança e logo sai voando. Pouco tempo depois pousa em minha cabeça, antes de voar mais uma vez. Realmente uma criança... Respiro fundo. Ele irá me exigir paciência.

O pokémon coruja nos deleta como campeões do torneio para aqueles que não nos notavam passar. Isso me irrita. Ouvir essas pessoas fúteis sussurrarem sobre nós, falando da minha criança como se eu a controlasse feito marionete.

- Morfeu. Bubble.

Reconheço meu nome e olho para minha menina imediatamente. O segundo nome me é estranho, mas a dedução lógica é que ele pertence a Hoothoot. Como a coruja não se aquietou, uso meu Psychic para congelá-lo no lugar em frente Alice. Bubble me olhou curioso, porém logo seus grandes olhos vermelhos miraram Alice. Era uma boa coruja, só que ainda muito nova.

Alice logo retirou os discos que eu já conhecia de sua mochila. Tms. Para mim o golpe Dream Eater. Muito útil. Para Bubble os golpes Psychic e Protect. A coruja parecia satisfeita com o novo aprendizado. Em sua inocência, ela pulava no mesmo lugar trocando rapidamente de pé.

Após os golpes, Alice se ergue para longe de novo. Fisicamente ela está a meu lado, porém sei que sua mente não está em mim e tampouco em Bubble. A jovem coruja olha intrigada e bate as asas, querendo mais um agrado. É só um filhote...

Respirando fundo me preparo para acabar com parte daquela inocência. Não gostaria, mas acho que será o melhor. Com meus poderes psíquicos mostro ao pequeno Hoothoot a mente de nossa mestra. Os olhos vermelhos parecem perder o brilho brincalhão temporariamente. Piedade é o que vejo no lugar. Não escondo nenhum detalhe que descobri desde que conheci Alice. O sacrifício de Purrloin no teste inicial, o sacrifício de Glameow nas ruas de Nyender, o estranho ser amarelo que a mantém prisioneira e o desespero pela liberdade que ela acredita que Arceus poderá fornecer.

Esperava que Hoothoot fosse chorar, gritar, ou fazer qualquer outra coisa infantil. Porém ele me impressiona. A pequena coruja bate suas asas e pousa no ombro de Alice, puxando alguns fios para trás de sua orelha e esfregando gentilmente sua face na dela como uma carícia. Pelo visto o filhote não é tão filhote assim... Dou um sorriso leve. Alice volta a caminhas e eu a sigo mais tranquilo. Agora não estou sozinho para cuidar dela.

Meus seguiam os de Alice sem preocupação. Apesar dos sussurros, nenhuma daquelas pessoas parecia ter importância. Bubble seguia no ombro da minha criança e não pude evitar sentir um pouco de inveja. Mentalmente digo para a pequena coruja aproveitar enquanto era um filhote. Logo seria um Hoothoot adulto e estaria muito grande e pesado para seguir no ombro de Alice.

Nossos passos não possuem destino e o fluxo de pessoas parece nos guiar. Bubble não olha pra ninguém. Está muito preocupado em ficar retirando o fio teimoso do cabelo de Alice que insiste em sair de trás de sua orelha. Apesar do barulho ensurdecedor da cidade, me sinto feliz. Meus olhos se desviam de Alice e miram as estrelas. Elas estão tão apagadas pelas luzes de Twister, mas ainda posso vê-las brilhar. Apesar das altas horas, a cidade parecia não parar.

Minha conversa silenciosa com os astros é interrompida por uma garota loira e alegre que nos reconhece. Minha guarda se ergue e penso em como manter Alice a salvo, entretanto a garota parece feliz em nos ver e pede um autógrafo. Fico surpreso com o pedido. Pela primeira vez alguém parece não nos temer. Meus olhos se voltam para minha menina a espera do que ela fará, porém, como esperado, ela não vê a garota. Seus olhos estão perdidos dentro do parque de diversões.

Bubble olha a menina e pia alegre, arrancando uma risada da mesma. Alice, por outro lado, retoma sua caminhada sem falar nada. Percebo que a jovem ficou triste e, com meus poderes psíquicos, faço a caneta rabiscar um A e um H em seu caderno. Alice Havalle. Seu sorriso me deixa satisfeito. Com uma despedida de cabeça, corro para alcançar Alice. Bubble pia me chamando, o que é desnecessário. Nunca perderia minha mestra de vista. Quando a alcanço, suas mãos deslizam pela grade de proteção da rota gigante e rapidamente entendo: ela já esteve aqui.

Ela reconheceu o lugar... Ela lembrou de algo...

Seu olhar não me diz nada. Ainda é dominado pelo mesmo vazio de sempre. Esperando que ela se recupere de mais lembranças e, quem sabe, se livre da maldição que a prende, puxo-a pela mão até a fila do brinquedo.

Estava feliz. Minha menina demonstrava reconhecer o lugar. Seria o inicio de sua liberdade do estranho pokémon? Espero que sim. Essa perspectiva me alegra demais. Na fila do brinquedo, olhava ansioso para frente, esperando que dentro dele mais alguma lembrança tomasse conta de minha criança. Entretanto minha atenção logo é desviada pela garota do autógrafo. Por que ela estava nos seguindo? Por que ela não parava de falar?

Conto até 10 diversas vezes, tentando controlar o estresse que começa a tomar conta do meu ser. Alice se mantém neutra, como se a garota não existisse e como se suas palavras insistentes também não existisse. Sinto inveja. Queria deixar de ouvir a garota falar de Arceus. De repente entendo o termo "fã louco". Como uma simples vitória podia terminar assim? Meus olhos se voltam para Alice e espero ansiosamente que, após ouvir tantas vezes o nome de Arceus, minha criança veja o desejo de Giratina pelo sangue da garota. No entanto ela continua neutra, mirando a roda gigante.

Mais três passos em direção ao brinquedo, mais cinco vezes contando até 10. A jovem não para de falar. Por que Alice não quer sacrificá-la? Quanto alguém teria de ser ignorado para parar de falar? Minha cabeça já lateja. Rezo a Giratina para que ele me livre do sofrimento, porém ele parece querer me torturar.

Uma segunda voz infantil preenche o ar. Por alguns segundos só posso ouvir o som das outras pessoas no parque, distante e normal. Entretanto logo são duas garotas falando. Duas jovens que aparentam ter a mesma idade mental. Bubble pia, acompanhando a conversa. Estou há um passo de gritar. Alice continua séria e as meninas falando. Seria muito errado hipnotizá-las?

Para minha esperança, chega a nossa vez no brinquedo. Os passos calmos de Alice a levam para o interior e ela se senta em um banco. Buscando um momento de paz com minha criança, me sento a seu lado, preparado para alguns minutos isolados daquela cidade barulhenta.

Será que Alice ficaria muito brava comigo se eu lançasse as duas para fora do brinquedo no ponto mais alto? Ou quem sabe acelerar esse brinquedo e ir embora. Não consigo entender como elas não param de falar! É uma tortura! Meu momento mágico com a minha criança, quebrado para sempre por duas meninas tagarelas.

Suspiro entediado. Minha cabeça esta apoiada na porta do brinquedo. Meus olhos vagueiam até as meninas e os mesmos pensamentos voltam a minha mente. Por que Giratina me testa dessa forma? Por que Alice não quer sacrificar a garota mais alta? Será que estou sendo testado? Será que eu devo realizar esse sacrifício? Meus olhos vagueiam em direção ao grupo mais uma vez. Outro suspiro. Sei que não é um teste. Sou só um pokémon que deve obedecer à Giratinista que me escolheu: Alice. Mas é tentador agir por conta própria...

Uma volta... A mais velha fala de Arceus.

Duas voltas... A mais nova ainda pergunta o motivo da minha criança não falar. Eu também gostaria que ela falasse mais. Sua voz é suave e agradável, diferente da voz dessas duas...

Terceira volta... A mais velha volta a falar de Arceus.

O brinquedo para. As duas pulam para fora e eu sigo na frente. Logo depois vem Alice com Bubble. Coruja boba. Fica piando feliz para as duas. Devia pensar comigo em formas de se livrar delas. A mais velha ainda está falando de Arceus e eu quero ir embora da cidade. Talvez meu comportamento seguinte possa ser explicado pelo meu desejo de paz. A verdade é que não sei. Não deu para evitar. Quando percebi, meus olhos brilharam e eu mostrei tudo para essa criança inocente. Talvez ela fosse só ingênua. Talvez fosse só uma fã feliz. Porém agora é uma criança triste. Lágrimas surgem nos seus olhos enquanto coloco em sua mente cenas de Alice, as poucas que conheço. Cenas onde o Deus Arceus permitiu que uma menina inocente fosse atacada por um pokémon misterioso. Cenas em que o Poderoso Arceus permite a dor. Essa é a realidade. Pessoas como ela, que ficam rezando, acreditando que ele irá voltar por conta estão erradas. Shinki não é uma terra de esperança, é uma terra de ação.

A loira começa a chorar e foge. Eu suspiro de novo. Por mais que tenha realizado meu desejo de me livrar dela, fiz uma criança inocente chorar. Olho para Alice e ela mira o caminho por onde a loira fugiu, aumentando meu remorso.

Mais um suspiro. Isto está ficando normal desde que chegamos na cidade. Olho para Alice, para Bubble e para a menina. Não quer me afastar. Sinto em meu coração que não devo me afastar e deixar a proteção de Alice para Bubble. A coruja ainda é muito nova para essa importante tarefa, entretanto o remorso não me deixa escolhas. Com imenso pesar e com remorso por me afastar de Alice, procuro a loira. Preciso mostrar-lhe que se ela parar de esperar e agir, Arceus realmente pode retornar. O principio de Giratina, o caos, deve ser buscado. Afinal de contas, o ovo de Arceus surgiu do caos e ele morreu no caos. O caos de Giratina então deve criar as condições adequadas para o renascimento do ovo do Arceus. Só preciso mostrar isso a ela e rápido, antes que algo aconteça a Alice.

Deixar Alice com um pokémon inexperiente e uma criança maluca... O que eu tenho na cabeça? Não devia sentir tanto remorso por fazer uma estranha chorar. Porém não consigo evitar de pensar na menina. Algo nela me lembra Alice e eu não quero vê-la chorar. Não como Alice já chorou no passado. Crianças não devem passar por isso. Sua inocência deve ser preservada.

Meus passos são calmos, apesar do nervosismo e do medo de deixar minha criança sozinha. Não é difícil localizar a loira faladora de Arceus. Seu choro e seus soluços são sons que destoam do barulho de risos tradicional de um parque de diversão. Quando a vejo, ela tem a face molhada de lágrimas e me olha com medo. Não quer ser temido. Só quer paz com a minha pequena.

Suspiro pela milésima vez nessa cidade infernal e sento-me de frente para a menina. Ela ainda tem medo. Meus olhos brilham e uma aura azul a envolve. O medo dela aumenta. Porém agora quero é tranquilizá-la, então meu Hypnosis e meu Psychic fazem o trabalho de mostrar-lhe as cenas corretas. Em sua mente, apago tudo ao nosso redor, até existirmos somente eu e ela no espaço, onde o caos reinava e onde o Egg de Arceus surgiu, trazendo consigo toda a vida existente hoje. Meus olhos lhe mostram a paz do começo, antes do homem surgir. Um mundo sem cidades, só com pokémons pré-históricos. Pokémons que ela nunca mais irá ver. Noto que ela fica curiosa com as imagens.

Após alguns instantes permitindo que ela desfrute dessa paz, mostro a Guerra. O caos que era o mundo e a queda de Arceus. Seus olhos se enchem de lágrima novamente. Não posso culpá-la, é uma cena triste realmente. Entretanto, agora ela pode entender o que quero explicar. Minha voz ecoa em sua mente e, graças ao Psychic, sei que ela irá entender o que falo.

"Arceus nasceu e morreu no caos, criança. Falar de amor não irá trazê-lo de volta, por mais que seja nossa vontade. Giratina, por outro lado, pode colocar esse mundo em caos novamente, o caos correto para que o Egg de Arceus ressurja em nossas vidas e a paz do início possa retornar a existir. Não espere, não reze. Levanta e faz, isso irá trazer Arceus de volta."

O brilho de meus olhos cessam, assim como o brilho ao redor da garota. Estamos de novo no parque de diversão. Ela me olha nos olhos e eu espero para ver sua reação a minhas palavras. Um lado meu espera que ela reaja rápido, já que devo retornar para Alice o mais rápido possível e voltar a protegê-la.

Alice?

Minha respiração começava a falhar. Meus olhos deslizavam pelas pessoas que saiam do parque de diversões, em busca da minha criança... Mas eu não a encontrava. Ninguém era ela.

Olhei para o céu encoberto pelas nuvens de chuva. Os pingos caiam pelo meu rosto e eu questionava o destino sobre seus planos. Por que me tiraram minha criança enquanto eu ajudava outra menina inocente? Por que me torturavam dessa forma?

Eu tentava respirar fundo, mas o pânico não me permitia. Meus passos eram, no começo, hesitantes, entretanto logo se tornaram apressados. Eu tinha de encontrar Alice. Minha criança poderia estar em perigo, poderia estar machucada, poderia estar na chuva, com frio... Minha mente me pregava peças enquanto eu corria pelo parque uma última vez, em busca de Alice. Eu me torturava com as visões da minha menina sozinha, mas não conseguia evitar. O medo era mais forte...

Após revirar o parque, passei a correr pelas ruas da cidade, entrando de loja em loja e de cassino em cassino. Olhava rosto por rosto em busca de Alice, mas ninguém era ela. A chuva ficava forte e minhas lágrimas de medo se misturavam a ela. Minha respiração era cortada por soluços e meu corpo inteiro tremia, mas não era de frio. Minhas mãos empurravam as pessoas no meio do caminho, forçando espaço para seguir minha busca.

Alice... Por favor, volte pra mim... Por favor Arceus, Giratina, qualquer um dos Sagrados Pokémons do passado, por favor, me ajudem a acha-la... Tragam-na de volta para mim... Eu imploro...

Minha pele estava encharcada e meu coração palpitava de medo, alegria e incredibilidade. Após tanto correr, eu a enxergava... Sentada... Em frente uma mesa de jogos... Chegava a sentir medo de que fosse minha mente desesperada me pregando uma peça.

Meus pés avançaram. Primeiro receosos... Porém, quando ela virou seus lindos olhos para mim, não pude me conter e me lancei contra ela. Meus braços envolveram sua cintura e meu rosto se enterrou em sua barriga. Eu chorava, mas agora de felicidade. Ela estava a salvo. Não importava de estar molhado e, consequentemente, molhando minha criança. Só me importava o fato de poder senti-la perto de mim novamente. Viva...

Oh, Arceus! Obrigado por tê-la protegido.

Eu rezo e agradeço. Meu corpo todo estremece em soluços de algo que não posso conter. Toda a dor e todo o medo pedem espaço para abandonar meu corpo e o choro é a única saída que posso lhes oferecer. Escuto o homem falar, porém não dou bola para o que ele diz. Nada mais me importa. Entretanto... Quando escuto a pirralha falar... Sua voz me atingi em cheio. Tenho certeza que foi ela a responsável por ter me tirado Alice.

Miro a criança. Sinto um misto de emoções pela menina. Raiva pelo medo que me causou. Gratidão por ter tirado a minha senhora da chuva antes que ela se molhasse. Desgosto pelo lugar escolhido...

Bubble, como um perfeito traidor infantil e ignorante da real situação, está pousado na cabeça da criança. Ele pia, me contando alegre sobre o dinheiro conseguido para Alice e sobre como isso poderá nos ajudar. Também me mostra o Lucky Egg que ganhou de nossa criança e exibi seu novo ataque: Roost. Tanta coisa aconteceu sem que eu visse... Só bastava que uma ruim acontecesse, para minha vida perder sentido...

Perdido em minhas lamurias, sinto algo encostar em minha pele, chamando minha atenção mais uma vez. Mais um golpe novo? Quando o sinto e descubro o que é, relaxo sob as mãos de Alice. Seus dedos deslizam por minha face. Ela está me vendo? Será que isso também é influência da criança? Se for, não a quero nunca mais longe de Alice, por mais que ela tenha o dom de me irritar.

- Venha.

Sua voz me chama. Enquanto ela se ergue e se solta de meu abraço, eu me sinto calmo. Minha menina falou comigo uma vez mais. Bubble voa e pousa em minha cabeça. Não me importo. Minha menina falou comigo... Ah, Arceus... Você brinca com meu coração? Ou é Giratina? Qual dos dois escreve em meu destino felicidade e dor tão próximas uma da outra?

Alice caminhava para a rua e eu a seguia sem jamais me importar com o caminho que ela escolheria. Só me preocupava em estar a seu lado e protege-la. A vida teria sentido, se eu pudesse ficar sempre ao lado da minha criança e senhora.

O som da chuva chamava minha atenção. Os trovões impiedosos, avisando tardiamente os raios que riscavam o céu. Nenhum deles atingiria o chão naquela cidade com tantos prédios altos e para-raios. Nenhuma árvore também alcançaria o céu, todas superadas pelos arranha-céu. Um lugar que eu não pretenderia voltar tão cedo.

Alice para na porta do cassino e eu paro a seu lado, direcionando meus olhos para seu rosto. Bubble está em minha cabeça e também mira nossa mestra com interesse. A face dela, porém, está serena. Seus olhos estão fechados e ela parece apreciar as poucas gotas de chuva que lhe tocam a face no limite da proteção do cassino. Resolvo não erguer minha barreira. Não quero estragar essa pequena felicidade. Imitando-a, Bubble e eu também fechamos nossos olhos e erguemos o rosto em direção à chuva, desfrutando de seu toque gelado e seu perfume tão singular. A poluição da cidade estragava um pouco o momento, mas eu era capaz de ignorá-la. Logo, eu sabia, Alice nos guiaria para fora do prédio e minha barreira a manteria protegida da chuva.

- Penélope.

O chamado me desperta. Somente agora percebo que a garotinha não está conosco. Alice a quer por perto? Por quê? Apesar de chamar pela criança, seus olhos ainda estão voltados para chuva. Ela quer seguir jornada. Só falta a menina. Meus olhos se voltam para trás, em busca de Penélope. É hora de seguir viagem afinal de contas e eu pretendia continuar caminhando por essas ruas com a minha Alice.

Sonsa? Trapaceira?

Não posso descrever o sentimento que me dominou quando ouvi aquele estranho ofendendo a minha criança. Já me habituara ao medo que sentiam dela, mas esse sentimento pelo menos mantinha os estranhos longe de nós. Agora, este ser inferior ousava se aproximar e ofendê-la diretamente? Nem ao menos me importava com a criança sob a capa de minha Senhora. Aquele homem conseguiu mais que meu desprezo.

Sei que pode parecer errado nutrir sentimentos negativos perante algo que muitos achariam pequeno... Mas para mim, Alice é a Deusa, ela é quem está livre dessas coisas. Eu sou um reles pokémon com um coração indignado devido ao fato de um homem sem a menor cultura e frequentador de lugares duvidosos ter ofendido o ser mais importante para mim neste mundo. Mesmo não sendo a pior das ofensas, esse homem não tinha o direito de ofendê-la!

Muito menos desafiá-la como parecia fazer...

- Hypnosis.

Ela ordenou. Eu obedeço. O som mal atingi meus ouvidos e meus olhos brilham em vermelho. Bubble pia insistente sobre minha cabeça, mas não me importo com ele. Só quero é fazer o estranho cair perante os pés da minha Alice...

Meu desejo na real vai além disso. Meu desejo era o de carregá-lo até o templo e lhe apresentar a faca da Gran Sacerdotisa. Entretanto se Alice o queria adormecido, ela o teria adormecido. Enquanto isso, Penélope só olhava a tudo com seu olhar travesso, aparentemente muito curiosa com a repentina palavra proferida por Alice. Algo tão precioso como sua voz não é algo que se ouça a todo momento.

Baixa?

Em minha concepção a faca era a melhor solução para aquele ser desprezível que não sabia medir as palavras perante alguém claramente superior. Estava indignado com tudo isso e queria atacar mais uma vez. Cheguei a dar um passo para frente e quase rosnei. Quase... Drowzees não são conhecidos por emitirem tal som. Entretanto a vontade era incontrolável. Até mesmo Bubble, acima de minha cabeça, parecia enfurecido.

Antes, no entanto, que eu pudesse fazer algo, sinto Alice passar a mão por cima de minha cabeça, sem me tocar. Ela pegava Bubble sobre os dedos e voltava a caminhar para o interior do cassino. A miro confuso... O que ela tem em mente?

A cada passo seu, as pessoas abrem espaço, recuando e permitindo uma área exposta. Penélope saltita no mesmo lugar e logo volta para perto da minha criança. A menina, estranhamente, parece se sentir segura sob a capa de Alice.

- Se deu mal moço! Era melhor ter ficado quieto e ter ido dormir!

A criança falava provocando o homem e se escondendo novamente sob a capa. De frente para o estranho, Alice parecia tranquila, mas estranhamente ciente dos acontecimentos. Eu ainda queria matá-lo, porém acompanhava minha senhora em seu caminhar leve. Antes que pudesse compreender os planos de Alice, ela toca um disco na cabeça de Bubble. Outro ataque? A coruja parece satisfeita com isso. Eu estou intrigado...

- Vá.

Uma única ordem e Bubble alça voo, posicionando-se no meio do campo. Permaneço ao lado de Alice, analisando a situação e intrigado ainda. Ela aceitou o desafio do estranho e agora o chamava para uma batalha no meio de um cassino? Qual seria sua intenção? Meus poderes psíquicos tentam invadir sua mente, entretanto ainda só encontro o vazio e o pokémon amarelo que mais odeio. Meus olhos se voltam para minha mestra, em busca de algo sinal da verdadeira ela. Minha busca é falha mais uma vez...

Ao entrar na mente de Alice eu percebo que ela se esforça para lutar. Entretanto ainda precisará de mim. Ralts parece ser uma pokémon educada que caiu sobre a desgraça de ter um treinador desprezível. Como é a primeira batalha de Bubble, opto por transferi-lhe algum comando mais analítico. Um Protect caso Ralts tente atacar e um Psychic para lançar qualquer ataque de volta para a pokémon. Deixaremos o homem iniciar o ataque, até para dar-lhe a chance de fugir do combate.

O ser desprezível que ousava chamar minha menina de baixa demonstrava ser completamente desprovido de escrúpulos ao mandar uma Butterfree lutar ao lado de Ralts contra um bebê como Bubble. Minha fúria era quase incontrolável e, já que ele usaria dois pokémons, me parecia certo que eu lutasse também. Meus olho se voltaram para Alice, em busca de aprovação para ingressar no combate.

- Seu covarde! Não consegue enfrentar um bebê numa luta justa? Tá com medinho é?

Penélope saía debaixo da capa da minha Senhora e gritava pulando no mesmo lugar. Eu me mantinha focado em Alice, a espera de sua ordem. O estranho parecia estranhamente vermelho de raiva. Entretanto eu só conseguia implorar para que minha mestra me permitisse lutar.

- Vá Morfeu.

Obrigado Arceus e obrigado Alice!

Poderei lutar e no presente momento era tudo o que eu queria. Fazer aquele desgraçado aprender a medir suas palavras e a ter respeitos perante uma mulher como a minha Alice. Ainda mais na presença de uma criança impetuosa e que certamente me traria problemas como Penélope.

Meus passos são calmos, porém minha alma ferve. Em simplesmente quatro passos, estou ao lado de Bubble e mirando nossos desafiantes. O outro fala com ironia e silenciosamente juro que o farei engolir suas palavras. Ele quer que comecemos? Muito bem. Então começaríamos...

Me conecto a Bubble para que assim possamos lutar em harmonia e me preparava para o duelo. Sabia que as ordens de Alice não viriam completas, mas mantinha minha mente ligada à dela, em busca de qualquer sinal de que ela lutaria conosco.

- Flash.

E para minha surpresa ela ordenou um comando. Bubble voou rapidamente para a linha de frente e iluminou o ambiente. Esperei o máximo de luz que cegaria nossos oponentes para lançar o Dazzling Gleam em direção à borboleta. Avisei a Bubble para retornar e pousar sobre minha cabeça após o flash, assim ambos poderiam usar um Protect para proteger aos dois e bloquear dois ataques diferentes de nossos adversários.

O covarde ainda mira no filhote. Um ser inferior mesmo. Ralts parece ter algum bom senso, entretanto Butterfree é tão desprezível quanto seu treinador. Patético.

- Psychic.

Alice só comanda um ataque, mas seu desejo é claro para mim como qualquer ordem elaborada. Com Bubble ainda pousado em minha cabeça, a conexão mental se torna mais fácil. O desafiante inescrupuloso quer derrubá-lo? Pois bem, provaremos que não é tão simples.

Meus olhos brilham. Bubble é instruído a usar Psychic no String Shot da borboleta e comandá-lo de volta, envolvendo a adversária, principalmente sua cabeça. Sem ver, ela não poderá atacar. Enquanto isso meu Protect deverá nos proteger do Attract de Butterfree e do Confusion de Ralts. Após terminar de enrolar a borboleta irritante, Bubble será responsável pela nossa proteção e o Protect dele irá me garantir segurança enquanto uso o meu Psychic para acertar a doce Ralts.

Não me orgulho de atacar Rats, diferente do ignorante de seu treinador ou de sua companheira borboleta. A psíquica parece ter mais bom senso e gentileza. Entretanto agora ela é minha adversária e, por Alice, não perderei.

Bubble pia sobre minha cabeça. A batalha parece deixa-lo ansioso. Eu só pensava na vitória e no desgosto que o homem sentiria por perder mais uma vez.

A situação não era muito boa... Entretanto, assim como Bubble, estou determinado a vencer esse duelo e fazer o arrogante treinador destes pokémons pedir pelo perdão de Alice e rezar para consegui-lo após tê-la insultado.

Bubble está ansioso demais. Isso prejudica nosso desempenho. Tento acalmá-lo, mas é difícil. Meu coração ainda não recuperou sua paz. Uso meus poderes para nos conectar a minha Senhora, em busca de tranquilidade. Sua mente enevoada pelo pokémon amarelo pode me ajudar a recuperar meu foco e fazer voltar a agir como eu realmente sou. Entretanto, não é a névoa que encontro... A mente de Alice está vermelha e seu coração também bate rápido. A curiosidade toma conta de mim e rapidamente viro meus olhos para vislumbrá-la.

Seu olhar me faz tremer...

Minha Senhora não parece a criança indefesa que quero proteger. Ela quer algo que não sei definir... Será que ela se sentiu atingida pelas injúrias do estranho? O outro nem parece notar a expressão dela. A mudança é sútil demais para quem não sabe ver... Mas para mim, que passo cada segundo possível admirando suas feições, é mais claro que a chuva ou os barulhos da cidade.

Ela quer vencer? Então eu vencerei por ela. Custe o que custar.

Peço para Bubble esconder-se atrás de mim. Não importa o ataque dos outros dois, sobreviverei a eles melhor do que ele. Oriento-o a usar o Flash mais uma vez, cegando a borboleta. Logo depois, o Foresight deverá revelar a posição de Ralts. É hora de atacar a pequena e doce Ralts.

Enquanto Bubble trabalha, aproveito a distração do Flash para atingir Butterfree com meu Hypnosis, incapacitando-a para o combate e certamente desconcertando seu mestre. Com isso feito, estarei a espera. Se Ralts me atacar, meu Protect será nossa proteção. Do contrário, a atingirei com meu Psychic.

Alice não fala absolutamente nada, porém sua mente vermelha e o pulsar de seu coração, que parece ecoar sobre o meu, me dizem mais do que qualquer palavra. Ralts possivelmente será liberta, mas se depender da minha Mestra, Butterfree e o homem não...